Juíza Adriana Cavalcanti é empossada como membro titular do TRE-RN

Juíza Adriana Cavalcanti é empossada como membro titular do TRE-RN

A juíza Adriana Cavalcanti Magalhães Faustino Ferreira tomou posse como membro titular do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte (TRE-RN) para o biênio 2019-2021. A sessão solene, que aconteceu nesta segunda-feira (03) no Plenário da sede do TRE-RN, foi presidida pelo Desembargador Glauber Rêgo, e contou com a presença do presidente da Armarn, juiz Herval Sampaio e diversas autoridades que prestigiaram o momento, além dos membros da Corte.
Após assinar o termo de posse e vestir a toga, a juíza discursou ressaltando a participação feminina no cenário eleitoral potiguar e o grato privilégio de dar continuidade às lutas travadas por suas antecessoras.
“Ao longo da minha trajetória profissional sempre me preocupou o fato de que, ainda nos dias atuais, somos impelidos a conviver com um Poder Judiciário que tanto se ressente da presença feminina. (…)
É intrigante constatar que uma Corte cujo papel é, entre outros, salvaguardar a participação feminina na política; fazer valer a efetividade de leis que visam à ampliação da participação de mulheres na vida partidária e à ocupação de mandatos eletivos, estimular a militância feminina e a apresentação de candidaturas, ao mesmo tempo, tenha visto passar tão poucas Magistradas com a oportunidade de não apenas demarcarem um espaço legítimo, mas mais do que isso, darem sua valiosa contribuição à jurisdição eleitoral.
Dos 108 juristas que servem nos TREs ao redor do Brasil, apenas 16 são mulheres. E, dessas 16, sou a primeira da história da Corte norte-riograndense a servir dois biênios consecutivos.
Neste momento, convido às senhoras e os senhores a fazerem, junto comigo, uma breve análise: somos poucas por que há poucas de nós em condições de ocupar assento neste Pleno? Ou ainda há restrições à participação do gênero feminino nas cortes judiciais? O que falta a nós, mulheres no caminho da Magistratura, para que tenhamos que conviver, nos dias de hoje, ainda com números tão díspares entre os gêneros em todos os ramos do judiciário e em todo o Brasil? (…)”

Segue abaixo a íntegra do discurso de posse:

DISCURSO DE POSSE DE ADRIANA MAGALHÃES FAUSTINO COMO JUÍZA TITULAR DO TRE-RN

Excelentíssimo Senhor Desembargador Glauber Rêgo, Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte, em nome de quem saúdo todos os integrantes desta Egrégia Corte;

Excelentíssima Senhora Doutora Cibele Benevides, Procuradora Regional Eleitoral;

Excelentíssima Senhora Fátima Bezerra, Governadora do Estado do Rio Grande do Norte, em nome de quem cumprimento os Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais, Vereadores e Prefeitos aqui presentes,

Excelentíssima Senhora Doutora Rossana Fonseca, vice-presidente da nossa seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, em nome de quem, saúdo, calorosamente, a cada um dos colegas Advogados que aqui acorreram;

Meu dileto amigo Doutor Glauber Alves, a quem agradeço, emocionada, as palavras elogiosas proferidas nesta tarde.

Demais autoridades.

Caríssimos servidores, aos quais cumprimento nas pessoas de Patrick Dubut e Alexandre Montenegro, assessores de meu gabinete.

Minhas senhoras e meus senhores,

Transcorrido o primeiro biênio, durante o qual tive a riquíssima oportunidade de aprender e de me dedicar ao mister de, mais do que julgar, buscar incansavelmente fazer Justiça, adentro a este Plenário com a mesma motivação e alegria, movida pelos elevados interesses que inspiraram minha chegada a esta Corte em 14 de setembro de 2017.

Ter percorrido essa breve estrada até aqui, na condição de Juíza substituta, me traz mais certezas do que as indagações que povoavam meu imaginário diante do estimulante desafio que, à época, se apresentava.

A vida entrelaça os rumos. Hoje, ouso dizer que, com permanente dedicação, sempre tentei traçar meus caminhos, desde os bancos da Universidade, quando internalizei em minha consciência a sagrada missão do Advogado, tão bem descrita por Rui Barbosa, que disse: “Na missão do Advogado também se desenvolve uma espécie de magistratura. As duas se entrelaçam, diversas nas funções, mas idênticas no objeto e na resultante: Justiça com o advogado, Justiça militante. Justiça imperante, no magistrado”.

Foi uma sábia lição, que me ajudou a compreender a convergência entre o múnus do advogado e a missão do magistrado.

Porém, ao longo da minha trajetória profissional sempre me preocupou o fato de que, ainda nos dias atuais, somos impelidos a conviver com um Poder Judiciário que tanto se ressente da presença feminina.

Nesta tarde, trago uma reflexão e uma ode, uma louvação às mulheres que desbravaram comas próprias mãos, com muita luta, resiliência e sabedoria, o caminho para que chegássemos ao presente momento.

O nosso Rio Grande do Norte tem sido pródigo na participação pioneira de mulheres na seara eleitoral, fato que muito nos orgulha e incentiva.

A poetisa Nísia Floresta, nascida em 1810, em Papary considerada a primeira feminista brasileira, precursora do sufrágio feminino no Brasil, foi a primeira mulher a romper os limites entre os espaços privado e público, ao publicar textos em jornais, dirigir um colégio para moças no Rio de Janeiro e escrever livros em defesa dos direitos das mulheres, dos índios e dos escravos.

Alzira Soriano, primeira Prefeita da América Latina, eleita em 1928, na cidade de Lajes, com 60% dos votos válidos.

A currais-novense Maria do Céu Fernandes, primeira mulher a se eleger Deputada Estadual em todo o Brasil.

Lindalva Torquato Fernandes, amada avó de meu marido, segunda Deputada Estadual eleita do Rio Grande do Norte e a primeira mulher, em todo o país, a ser escolhida, em 1953, para presidir um Tribunal de Contas.

Doutora Eliane Amorim das Virgens, nomeada, em 1996, primeira Desembargadora do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte.

Quantas Nísias, quantas Alziras, quantas Celinas, quantas Lindalvas, quantas Elianes tiveram que transpor barreiras, romper com a lógica imposta a elas e às demais mulheres, cada qual em sua época, para que chegássemos até aqui?

Do alto dos seus 43 anos de magistratura, a presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministra Rosa Weber, tão bem pontuou sobre o presente, em sua mensagem proferida por ocasião do Dia Internacional da Mulher, no último dia 8 de março: “muitas antes de nós foram pioneiras na construção da voz feminina da cidadania no mundo todo, abrindo caminhos para a participação ativa da mulher na vida pública e privada. Essa, contudo, é uma trajetória inacabada. As desigualdades e assimetrias ainda são uma realidade, a exigir firmeza para alcançarmos novos e constantes avanços”.

O ano é 2019. Nos 87 anos de Tribunal Regional Eleitoral no Rio Grande do Norte, somos quatro mulheres, apenas quatro. Repito: quatro mulheres neste plenário, ao longo de quase nove décadas. Pela mercê de minhas antecessoras, Maria do Perpétuo Socorro Wanderley de Castro, Dulce Siqueira de Morais e Cristina Wanderley Fernandes, hoje, também estou aqui, e a elas estendo meu reconhecimento e profunda gratidão.

É intrigante constatar que uma Corte cujo papel é, entre outros, salvaguardar a participação feminina na política; fazer valer a efetividade de leis que visam à ampliação da participação de mulheres na vida partidária e à ocupação de mandatos eletivos, estimular a militância feminina e a apresentação de candidaturas, ao mesmo tempo, tenha visto passar tão poucas Magistradas com a oportunidade de não apenas demarcarem um espaço legítimo, mas mais do que isso, darem sua valiosa contribuição à jurisdição eleitoral.

Dos 108 juristas que servem nos TREs ao redor do Brasil, apenas 16 são mulheres. E, dessas 16, sou a primeira da história da Corte norte-riograndense a servir dois biênios consecutivos.

Neste momento, convido às senhoras e os senhores a fazerem, junto comigo, uma breve análise: somos poucas por que há poucas de nós em condições de ocupar assento neste Pleno? Ou ainda há restrições à participação do gênero feminino nas cortes judiciais? O que falta a nós, mulheres no caminho da Magistratura, para que tenhamos que conviver, nos dias de hoje, ainda com números tão díspares entre os gêneros em todos os ramos do judiciário e em todo o Brasil?

Essa moldura não é condizente com os dados da Pesquisa Nacional por Mostra de Domicílios, a PNAD Contínua, de 2017, realizada pelo IBGE, segundo a qual o número de mulheres no Brasil é superior ao de homens. Somos 51,6% da população brasileira. E somamos, ainda, segundo dados da Justiça Eleitoral, 52% do eleitorado brasileiro.

Na esfera educacional, há mais mulheres cursando o Bacharelado em Ciências Jurídicas do que homens, de acordo com o Censo da Educação Superior, realizado pelo Ministério da Educação, que apontou, recentemente, um percentual de 54% de alunado feminino.

Ainda, conforme dados do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, até o ano de 2023, vão existir mais Advogadas do que Advogados no País.

No entanto, quando adentramos na Magistratura, o cenário é diverso. Levantamento feito pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias, órgão do Conselho Nacional de Justiça, mostra que dos 18 mil Magistrados em atividade no Brasil, apenas 37,3% são mulheres. Somos um dos Estados com percentual acima da média nacional, sendo 41,2% de Juízas e Desembargadoras.

Os dados demonstram, ademais, que, à medida em que ascendemos da primeira instância à mais alta Corte, quando os critérios de nomeação tornam-se mais subjetivos, a participação das Magistradas vai minguando.

Mais uma vez o Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ nos confronta. Dentre os membros de Tribunais de Segunda Instância, apenas 23% são mulheres. Já nas Cortes Superiores, somente 13% de seus integrantes são do gênero feminino.

Tal cenário, como não poderia deixar de ser, tem causado inquietações, a ponto de a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, a ENFAM, com o apoio do CNJ, ter promovido, no último dia 15 de maio, o primeiro curso “A Mulher Juíza”, com o objetivo de desenvolver estratégias de ampliação da participação feminina na magistratura.

Na ocasião, o diretor-geral da ENFAM, ministro Herman Benjamin, lucidamente, asseverou que “o Poder Judiciário vem se afastando do perfil da sociedade, e ao dela se distanciar na composição de seus integrantes, a instituição perde legitimidade política, diversidade humana e qualidade jurídica. Afinal, é descabido exigir que o cidadão apóie o Judiciário como garantidor da lei e dos direitos humanos quando ele próprio age de maneira incompatível com a igualdade de gênero”.

Inegavelmente, ainda há muito a fazer. Como bem apontou o filósofo e sociólogo alemão, Habermas, em sua obra denominada “A Inclusão do Outro”, a sociedade democrática foi moldada historicamente por grupos dominantes que estabeleceram um padrão em detrimento das minorias. Todavia, essas mesmas minorias encontram amparo no modelo democrático, ao obter espaço para a coexistência e a possibilidade de exposição de seus argumentos e ideias.

Reconheço a responsabilidade de ser mulher neste espaço, ao mesmo tempo em que tenho ciência do longo caminho que temos a percorrer em busca de igualdade de gênero e consequente aumento da legitimidade das decisões proferidas pelo Judiciário.

À propósito, em palestra proferida em São Paulo, na semana passada, o ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, destacou que em todas as reuniões de seu governo, sempre havia ao menos uma mulher presente. Na visão de Obama, “se as mulheres não estão incluídas, estamos desperdiçando talento”.

É necessário, é premente, é imprescindível que avancemos. Afinal, a paridade é o meio idôneo de se garantir a Justiça, como bem disse Rousseau.

Por isso mesmo, acolho com modéstia e responsabilidade a incumbência de escrever, a partir de hoje, um capítulo que honre a história daquelas que vieram antes de mim, e de consolidar um caminho de merecimento para que outras juízas eleitorais aqui cumpram seu inderrogável papel, especialmente agora, em que um novo momento se descortina para a Justiça Eleitoral, com o aumento do espectro de sua atuação. Como bem decidiu o Supremo Tribunal Federal, em 14 de março deste ano, ao confirmar sua jurisprudência, compete às Cortes eleitorais processar e julgar crimes comuns que apresentem conexão com crimes eleitorais.

Renovo, aqui diante de meus pares, de meus familiares, de meus amigos, de João, meu filho amado, e, especialmente, de Edson, companheiro de vida, a quem tanto amo e a quem tanto devo, o meu compromisso de zelo com a coisa pública e de dedicação irrestrita à atividade jurisdicional que continuarei a exercer com orgulho, civismo e absoluto empenho.

Que Deus nos abençoe. Muito obrigada.

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