FÓRUM NACIONAL DE MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO, Presidido pelo Juiz Alexandre Abreu do TJMA, emite Nota Técnica pela rejeição do Projeto de Lei PL-80/2018, que torna obrigatória a presença de advogados nas sessões de mediação e conciliação, inclusive as pré-processuais.
A nota, apoiada por Presidentes e Coordenadores dos Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, elenca tópicos em que aponta o prejuízo para o compromisso constitucional da universalização do acesso aos meios adequados de conflitos, com especial preocupação no atendimento às pessoas mais carentes e residentes em áreas distantes dos centros urbanos.
“Diante de tantas ações desenvolvidas, não apenas pelo Judiciário, mas por iniciativa do Legislativo e Executivo, para assegurar ao cidadão os meios facilitados e desburocratizados de solução de conflitos, a exigência constante no PL 80 pode significar um afastamento do Estado com a sociedade, permitindo que forças paralelas assumam o vácuo deixado pelo Poder Público”, afirma o Presidente do FONAMEC.
Confira a nota na íntegra:
NOTA TÉCNICA Nº 001/2019
Objeto: Obrigatoriedade da participação do Advogado na solução consensual de conflitos.
A atribuição constitucional de acesso universal aos meios de defesa e garantias de direito foi delegada ao Poder Judiciário (art. 5º, inc. XXXV), que encontra no Conselho Nacional de Justiça, instituição pública que visa aperfeiçoar o trabalho do sistema judiciário brasileiro, a atribuição pelo desenvolvimento de políticas para a promoção da efetividade do Poder Judiciário, tem como marco no tratamento adequado de conflitos a Resolução 125/2010, que atribui aos Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos – NUPEMECs dos Tribunais de Justiça a missão de desenvolver essa política.
O Fórum Nacional de Mediação e Conciliação FONAMEC, criado em 12 de dezembro de 2014, durante o Encontro Nacional de Núcleos de Conciliação, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, e, a partir de 08 de março de 2016, passou a integrar a Política Nacional de Tratamento de Conflitos, através da previsão contida nos artigos 12-A e 12-B da Resolução 125/2010 do CNJ, na condição de representante dos NUPEMECs, grande implementador público das soluções extrajudiciais de conflitos, com a realização de mediações e conciliações processuais e pré-processuais, diante de relevante impacto na garantia da universalização do acesso à Justiça que pode advir do Projeto de Lei 80/2018, que estabelece a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos, vem apresentar sua posição sobre o tema, com as seguintes ponderações:
1. A Política Judiciária Nacional de tratamento adequado de conflitos é resultado dos encontros promovidos pelo Poder Executivo, Legislativo e Judiciário que formalizaram o 2º Pacto Republicano para garantia do acesso universal à Justiça.
2. A Solução Consensual do Conflito é diretiva fundamental do Código de Processo Civil, atribuindo ao Estado a sua promoção (§ 2º, art. 3º, CPC), devendo ser estimulado inclusive no curso do processo (§ 3º, art. 3º, CPC) também fora dele, antes mesmo da judicialização, como já preconizava a Constituição Imperial de 1824.
3. A Lei 13.140/2015, que dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsia, esclarece que a atividade é exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia, o que revela ter o ato FONAMEC/MA um profundo respeito pela autonomia da vontade das partes, tanto na sua participação, quanto no resultado que, porventura, ali venha a ser alcançado.
4. Tal autonomia de vontade possui escudo, dentre outras normas, na Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica, que admite como garantia judicial das pessoas (art. 8º) o direito de defesa pessoal ou de escolha de defensor (letra d), diretiva o Brasil se compromete a cumprir.
5. Dentre as Leis Nacionais, o art. 791 da CLT (excludente prevista no PL 80/2018), o art. 9º da Lei dos Juizados Especiais Cíveis (constitucionalidade reconhecida pelo STF na ADI 1.539) são dispositivos que reforçam esse entendimento.
6. O Conselho Nacional de Justiça, acolhendo provocação do FONAMEC, na decisão da Conselheira Daldice Santana nos autos do Processo 0010642- 32.2018.2.00.0000, após brilhante parecer da Conselheira Cristiana Ziouva, destaca que a flexibilização da indispensabilidade prevista no art. 133 da CF é assegurada em nome de um bem maior: acesso universal à solução de conflitos, com uso de mecanismos simples, rápido e efetivo e informais.
7. Em um país com dimensões continentais, com localidades de difícil acesso, em que conflitos interpessoais não encontram instituições formais para solução de conflitos, tem nos atendimentos feitos pela Polícia Militar ou Centros de Atendimentos Sociais dos Municípios, por pessoas capacitadas na resolução de conflitos e com reconhecimento judicial desses entendimentos, os ambientes em que se ajustam soluções dos problemas de vizinhança, família, pequenas dívidas, utilizando-se do sistema de solução consensual a garantia de uma resposta legítima para as pendências, situação que se veria comprometida de resultado pela obrigatoriedade de se ter a presença de um advogado para cada uma das partes do conflito, exigência que inibiria a formalização de situações materialmente já experimentadas ou que se deixam de cumprir por ausência de força executiva.
8. Questões simples, como o reconhecimento de divórcio de pessoas há muito separadas, confirmação de paternidade, pagamento negociado de dívidas, dentre outras questões que afetam o cotidiano das nossas comunidades afastadas dos centros urbanos, restariam impossibilitados, diante da vigência do PL 80/2018, fator que implicaria no afastamento do Estado da sociedade, abrindo espaço para que estruturas paralelas, nem sempre inspiradas de bons propósitos, venham a assumir esse vácuo do Poder Público.
9. Nas relações negociais que envolvam partes residentes no estrangeiro, com legislação mais compatível com respeito à autonomia das pessoas, como nas compras de mercadorias ou locações por temporadas pelo comércio eletrônico, em que são oferecidas soluções dos conflitos por plataformas de mediação e conciliação, não se daria a validade FONAMEC/MA desses atos em face do PL 80/2018, pois não teriam advogados acompanhando todas as partes transacionando, gerando uma questão que tem recebido o nome de “Custo Brasil”.
10. Nas mediações previstas, para os usuários dos serviços públicos, conduzidas pelas Ouvidorias dos órgãos (art. 13, inc. VII, Lei 13.460/2017), para que se assegure o patrocínio de Advogados na defesa do cidadão carente, o custeio desse trabalho não é contemplado pelo PL 80/2018, despesa que afeta o limite da EC 94.
11. Reconhecido o direito das pessoas à dispensa do Judiciário, para solução de suas questões solúveis por transação, no reconhecimento maior de seu direito de deliberação (CPC, Lei da Arbitragem, Lei da Mediação, Lei dos Usuários dos Serviços Públicos), trazer a exigência de validade da solução autocomposiva com a presença obrigatória de advogados seria um retrocesso na adequação dos meios ao objetivos esperados (Lei 13.460/2017).
Em face das ponderações aqui anotadas, manifesta-se o Fórum Nacional de Mediação e Conciliação – FONAMEC, com a anuência dos Presidentes e Coordenadores dos NUPEMECs, pela reflexão quanto aos impactos negativos à sociedade brasileira, para que se rejeite o Projeto de Lei 80/2018.
São Luís (MA), 02 de maio de 2019.
ALEXANDRE LOPES DE ABREU
Presidente Fórum Nacional de Mediação e Conciliação – FONAMEC
Des. RADUAN MIGUEL FILHO Pres. NUPEMEC/TJRO
1º VICE-PRESIDENTE DO FONAMEC
Juíza. LUCIANA YUKI SORRENTINO Coord. NUPEMEC/TJDFT
2º VICE-PRESIDENTE DO FONAMEC
Des. SUELI PININ Pres. NUPEMEC/TJAP Des.
JANIECE GOULART GARCIA UBIALLI Pres. NUPEMEC/TJSC
Des. JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES Pres. NUPEMEC/TJSP
Des. DAHIL PARAENSE DE SOUZA Pres. NUPEMEC/TJPA FONAMEC/MA Des. ERIK DE SOUSA DANTAS SIMÕES Pres. NUPEMEC/TJPE
Des. JANETE VARGAS SIMÕES Pres. NUPEMEC/TJES
Des. CÉSAR CURY Pres. NUPEMEC/TJRJ
Des. JANIECE GOULART GARCIA UBIALLI Pres. NUPEMEC/TJSC
Juiz PAULO CÉSAR ALVES DAS NEVES Coord Adj. NUPEMEC/TJGO
Des. TEREZA NEUMANN DUARTE CHAVES Pres. NUPEMEC/TJCE
Juiz. GILDO ALVES CARVALHO FILHO Coord. NUPEMEC/TJAM
Juíza. LUCICLEIDE PEREIRA BELO Coord. NUPEMEC/TJPI
Des. JOSÉ LUIZ OLIVEIRA DE ALMEIDA Pres. NUPEMEC/TJMA
Juiz JOSÉ MIRANDA SANTOS JÚNIOR Coord. NUPEMEC/TJAL
Des. MOZARILDO MONTEIRO CAVALCANTI Pres. NUPEMEC/TJRR
Des. WALDIRENE CORDEIRO Pres. NUPEMEC/TJAC
Des. DILERMANDO MOTA Pres. NUPEMEC/TJRN
Juiz MANUEL DE FARIAS REIS NETO Coord. NUPEMEC/TJTO
Des. LEADRO DOS SANTOS Pres. NUPEMEC/TJPB
Des. ANA LUCIA FREIRE DE ALMEIDA DOS ANJOS Coord. NUPEMEC/TJSE FONAMEC/MA