VI Enaje: Moro e Colombo destacam que é preciso uma mudança de cultura para que a corrupção chegue ao fim

VI Enaje: Moro e Colombo destacam que é preciso uma mudança de cultura para que a corrupção chegue ao fim

Encerrado diante de uma plateia entusiasmada, o último painel desta sexta-feira (4) do VI Encontro de Juízes Estaduais (Enaje) abordou o “Combate à Corrupção – Experiência Italiana e Brasileira”. O talk show contou com a presença do juiz Sérgio Moro, que conduz a Operação Lava Jato, e do ex-magistrado italiano Gherardo Colombo, um dos responsáveis pela Operação Mãos Limpas. A mediação foi feita pelo presidente da AMB, João Ricardo Costa.

O presidente da AMB disse que operações como a Lava Jato são fundamentais para o País e destacou a experiência na magistratura de Moro e Colombo. “Nossos painelistas vão mostrar o quanto essas experiências das operações Lava Jato e Mãos Limpas têm uma dimensão muito maior do que aparentam”. João Ricardo lembrou que os casos de corrupção envolveram contratos com a administração pública.

Colombo

Gherardo Colombo fez uma síntese da Operação Mãos Limpas na Itália, que começou em 1992 e revelou que quase todas as grandes empresas tinham fundos ilegais que serviam para corromper. “Nós descobrimos, talvez, cem mil investigações e financiamentos ilícitos”, disse. “Acho que foram dezenas de milhares de casos. A corrupção na Itália é um sistema. As relações entre a administração pública e os empresários passam pela corrupção. A operação durou tanto tempo praticamente porque nós continuávamos a descobrir provas de corrupção, movimentação de dinheiro que passava de uma parte para outra. Fizemos mais de 700 pedidos internacionais, com pedidos bancários, entre outros, a mais de 29 países.”

O ex-magistrado italiano contou que o processo de investigação persistiu por mais de 13 anos e a opinião pública, que no começo era muito favorável e defensora da operação, começou a deixar de apoiar a atuação do Judiciário. Segundo ele, isso ocorreu a partir do momento em que foram sendo averiguadas irregularidades em diversos segmentos, como atos ilícitos cometidos por profissionais das áreas de medicina, engenharia, entre outros. “Os cidadãos começaram a achar que a operação não tinha fim, que as investigações acabariam entrando na casa deles”, relatou Colombo, contando em seguida sua decisão de se afastar da magistratura em 2005.

“Eu passei 33 anos na magistratura, atuando contra crimes de colarinho branco. Em determinado momento passei a me sentir como um encanador que tenta consertar uma torneira quebrada”, comparou ao explicar o seu sentimento em renunciar à Suprema Corte Italiana. “Então o encanador teve uma ideia: verificar o encanamento e o registro. Quem sabe no final ele volte à cozinha e a água saia”.

A partir dessa decisão, Gherardo Colombo passou a dar palestras em escolas falando da importância do papel do cidadão no combate à corrupção do dia a dia. “Será que nós não temos que pensar em algo que acontece antes dos tribunais para fazer com que realmente aja Justiça? Eu olhei ao redor e acho que encontrei a relação entre cidadão e regras. Se o cidadão não entende como as regras são importantes para sua vida, ele vai transgredir.”

Moro

Em sua explanação, o juiz Sergio Moro fez algumas analogias entre a operação Lava Jato e a Mãos Limpas, e fez questão de destacar que não podia deixar de atender ao convite da AMB de comparecer ao VI Enaje. “O trabalho tem sido muito intenso na 13a vara. Mas dada a magnitude desse evento de poder falar com magistrados do Brasil inteiro eu não podia deixar de aceitar essa oportunidade”.

Moro contou que assim como a operação Mãos Limpas, ninguém tinha ideia da proporção que a Lava Jato iria tomar. A operação teve início com o caso de um ex-diretor da Petrobras e depois foi descoberto o crime contra a administração pública e valores milionários não declarados. “Até o momento existem quatro ex-diretores da Petrobras que foram condenados criminalmente. Todos os quatro foram presos. Todos eles mantinham contas secretas no exterior com saldos milionários: conta na Suíça, em Mônaco, em Luxemburgo. Um fato que chamou a atenção é que no curso das investigações eles fecharam as contas que tinham na Suíça e transferiram para outros locais”, destacou.

O juiz deu detalhes do esquema de propina e, num paralelo com a Mãos Limpas, observou a constatação de que várias das pessoas processadas na operação italiana foram surpreendidas, anos depois, atuando em outros crimes, em um novo esquema criminoso, “para ilustrar a persistência desse fenômeno que é a corrupção”.

Segundo o magistrado, a corrupção tem um caráter serial. “A corrupção é um sistema. A atuação da Justiça é uma ação necessária, mas não é uma condição suficiente. É necessária uma mudança de comportamento na sociedade”, destacando que não existe essa cultura apenas no poder público.

Por fim, exaltou que os juízes, como aplicadores da lei, têm um papel fundamental e que talvez esse problema no Brasil tenha se agravado em decorrência da impunidade. “Quando a sociedade vê escândalos criminais e verifica que a Justiça não dá uma resposta vai perdendo a fé na Justiça, nos juízes, na lei e na democracia”, finalizou Sérgio Moro.

Fonte: AMB

Fonte: post

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